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A EXPERIÊNCIA DE UMA PROFISSIONAL DE TEATRO EM UM MUSEU DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIAS

Por Izabela Borges


Flogopita, Turmalina Paraíba, Alexandrita, Albita, Amazonita, Bauxita, Argilomineral, Tungstênio. Não, você não está em um blog errado. Aço, Hematita, amonóides, trilobita, fóssil e pseudofóssil. Eu juro que eu vou falar sobre Teatro.

Imagina você estar quase formada em Teatro e ter como "companheiros" de trabalho os nomes citados acima. E não, eu não tinha passado em um teste de elenco para ser geóloga.

Durante toda a minha formação artística e também como professora, eu tive a oportunidade de trabalhar em espaços de educação formal, tais como escolas regulares. Dessa forma, eu já tinha alguma experiência nesses espaços, mas ainda assim seguia com um desejo antigo de experimentar um ambiente de educação não-formal.


Eu queria trabalhar em um Museu!


Passei a buscar em alguns sites quais instituições de Belo Horizonte estavam realizando processos seletivos de contratação. Ao mesmo tempo, eu também enviava currículos, independentemente da existência de alguma vaga estar "aberta".


Procurava em editais passados se o curso de Teatro tinha sido incluído nas bases dos processos seletivos desses museus e via que muitos não faziam menção a essa área. Eu só sabia dessa possibilidade apenas por ter colegas de curso trabalhando em espaços museais, dentre eles o CCBB, o Espaço do Conhecimento – UFMG e o Museu do Futebol – Mineirão, que eram instituições com o costume de aceitar estudantes de Teatro em cargos dentro dos seus programas educativos.


Também fiz uma pesquisa rápida pelo grupo do Teatro – UFMG no Facebook. Perguntei aos meus colegas se eles conheciam alguém que tinha trabalhado com o setor educativo em algum museu da cidade sendo estagiários(as) e, à época, obtive pelo menos oito opções como respostas positivas:



Além do MM Gerdau (Museu das Minas e do Metal), onde eu fiz um estágio durante um ano, falarei aqui [finalmente!] como foi a minha experiência de ser uma estudante/artista/professora de Teatro em um Museu de Ciências e Tecnologias.


A minha iniciação dentro da equipe do educativo aconteceu através de formações com a própria equipe. Nos primeiros dias, a minha tarefa era a de ler uma série de artigos, cartilhas e textos, que falavam sobre o museu em que eu estava (salas e conteúdos, projetos, história do prédio, etc), além de retratarem temas sobre as relações entre museus, ciência, educação, mediação, patrimônio (material e imaterial), entre vários outros assuntos desse universo.


Lembro de pensar que o meu caminhar pelo espaço livremente (prática conhecida nas aulas de Teatro) se transformou em método de observação em um espaço físico museal. Sentia que era como me relacionar com a cenografia de uma peça, pois tudo importava e estava ali por algum motivo (e eu tinha que descobrir isso!).


A diferença era que, ao mesmo tempo em que eu estava no lugar de espectadora, podia e precisava ser agente da minha ação, que seria além do assistir. Lá fui eu, então, tocar o que poderia ser tocado, ler, escutar, ler outra vez, interagir, me aproximar e me afastar…


Os dias foram passando e, ainda nessa dinâmica de observar esse espaço e as pessoas que passavam por ali, fui observando que eu já estava em processo de mudança. Eu já não era a mesma pessoa que frequentava museus. Ao chegar no MM Gerdau, o meu corpo já reagia de outra maneira.

Sabe quando você começa a estudar Teatro e depois vai assistir a uma peça e sente que não desfruta da mesma maneira? Que está ali vendo, mas ao mesmo tempo observando tecnicamente como tudo funciona? Era assim como eu me sentia.

Algum tempo depois das formações iniciais, da observação dos meus colegas e do público visitante, chegou o momento de ocupar a minha primeira função como educadora daquela instituição. Estar presente (de corpo e alma) em algum ponto específico. O meu trabalho era estar ali para o visitante em qualquer necessidade, desde consultas sobre os conteúdos relacionados ao museu, instigando-os à apreciação, até responder onde ficava o banheiro ou se o lanche da cafeteria era bom.



Primeira semana no museu - Ateliê científico - Foto: Arquivo pessoal

E lá estava eu, a quase licenciada em Teatro, me preparando para visitas com grupos escolares e não escolares, falando de coisas que eu sequer me lembrava da época de escola.

Mas, antes de realizar as visitas mediadas propriamente, lembro que me foi apresentado o texto “O teatro em museus e centros de ciência no Brasil”, de Leonardo Moreira e Martha Marandino. Já nas primeiras páginas, são elencadas algumas relações entre Ciência e Teatro. Entre elas, a que identifica duas categorias: "(1) o teatro usado como apoio didático para transmissão de conceitos científicos e (2) a ciência emprestando seu conteúdo de ciência ao teatro". ¹

Diante disso, notei que, naquele contexto inicial e logo depois com a experiência que adquiri no museu, o Teatro estava presente em mim de diversas formas.


Na maioria das vezes o meu fazer teatral não estava vinculado a uma apresentação utilizando luz e figurinos. O Teatro era um apoio didático, no sentido de ser uma ferramenta para mim ao estar enraizado no meu fazer.


Eu sou uma pessoa de Teatro, logo as minhas ações também seriam.


Quantas vezes foi necessário improvisar? Escutar o ruído e a maneira como o grupo se comportava para, naquele momento, decidir mudar o plano previsto? Quantas vezes percebi que se instalava ali, naturalmente, um jogo dramático, com pessoas expressando livremente o seu corpo, sua oralidade e suas expressões?


Eu me aproveitava disso dentro do jogo, utilizando a oportunidade para mostrar e para falar tudo que precisava.


Isso tudo era Teatro!

É claro que existiam dias em que nada disso funcionava, mas, mesmo assim, o Teatro estava ali: me ensinando a aceitar que tudo bem errar, não conseguir, porque eu teria a oportunidade de fazer de novo e de novo.



contação de histórias para o público espontâneo - Foto: Arquivo Pessoal

Ainda no texto de Leonardo Moreira e Martha Marandino, cita-se Barbacci (2002) em uma frase que diz “a finalidade [do Teatro] em museus é a transmissão de conhecimentos para um público-alvo, normalmente estudantes”. No entanto, eu não diria que a finalidade do Teatro no museu, ou até mesmo a do educador com formação em Teatro no museu (ou qualquer que seja a área), seja a de transmissão de conhecimentos ou apenas isso. Vai muito além.


Nós, enquanto educadores, devemos nos apropriar das instâncias da "abordagem triangular" (contextualizar, fazer-exprimir-conhecer, ler-apreciar), da qual trata Ana Mae Barbosa. Isto é, tornar a experiência do visitante uma experiência de mudança, seja por apresentar um conteúdo novo ou por mostrar que aquele espaço é público e que ele deve e pode voltar!


Acredito que o tipo de visita que eu propunha, as ideias que eu trazia e a minha maneira de mediar se aproximavam muito dessa metodologia da abordagem triangular.



Alunos durante uma visita - Foto: Arquivo Pessoal
Alunos durante a visita fazendo uma dinâmica que criei para falar de Deriva Continental e Pangeia - Foto: Arquivo Pessoal

O espaço museal, com a ferramenta de mediação, me apresentou uma possibilidade de trabalho e me mostrou como esse espaço tem um potencial criativo para além das suas obras prontas.


Estar em um lugar como esse, com a experiência que eu tive, me permitiu ser uma profissional criativa, com espaço para propor e criar.


O Teatro, nesse período em que estive no MM Gerdau, apareceu também como um tipo de ferramenta de integração de equipe, através das oficinas que eu ministrava, para os profissionais da limpeza e o grupo de mediadores.


Dinâmicas, contação de histórias, jogos criados para falar de algum conteúdo, peças teatrais apresentadas com figurinos e textos decorados, mas também, e talvez sobretudo, simplesmente o meu caminhar por aquele espaço me tornaram "uma pessoa do Teatro" em um Museu de Ciências e Tecnologias.


E agora, além disso, eu sou uma pessoa do Teatro que posso te explicar muito bem sobre aquelas palavras que eu escrevi no início desse texto.




 



 

REFERÊNCIAS


  • BARBOSA, Ana Mae. A Imagem no Ensino da Arte. 5.ed. São Paulo: Perspectiva, 2002.


  • CORREA, B. IZABELA. De aluna à professora: influências e reflexões sobre a prática teatral; 2018; Trabalho de Conclusão de Curso; (Graduação em Teatro) - Universidade Federal de Minas Gerais.


  • MOREIRA, Leonardo Maciel; MARANDINO, Martha. O teatro em museus e centros de ciências no Brasil. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, v.22, supl., dez. 2015, p.1735- 1748.


 

Izabela Borges nasceu em Belo Horizonte, mas hoje em dia chama de casa a cidade de Santiago, no Chile. É formada em Teatro pela UFMG e iniciou a carreira artística no centro de formação "Valores de Minas", em 2010. Atriz e improvisadora, seu trabalho explora as possibilidades da atuação, dos encontros e da didática em espaços formais e não formais de ensino-aprendizagem.

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